quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

A acumulação primitiva do capital - As bases do capitalismo

O seguinte artigo foi baseado no capítulo "A assim chamada acumulação primitiva" da obra "O Capital", de Karl Marx.

Karl Marx - Autor de "O Capital"
            Para que se possa compreender o tema que será abordado durante o presente texto, se faz necessária a compreensão a respeito do que seria a acumulação primitiva do capital. Para que o capitalismo pudesse surgir era necessário que houvesse toda uma configuração anterior, a qual propiciaria a sua sustentabilidade.  As explicações a respeito dessas condições, as qual seria, genericamente falando, a acumulação primitiva do capital, possuem duas vertentes que são abordadas por Marx. A primeira corresponde à concepção adotada pela economia política: segundo ela, havia pessoas astutas e espertas que trabalhavam e pessoas que nada faziam. Essa foi a base da exploração dessas últimas, que no futuro teriam apenas sua força de trabalho para vender. Marx critica ferrenhamente essas idéias, alegando a omissão da historiografia quanto aos métodos utilizados para que essa configuração pudesse ser observada. Para ele, os fatores que acarretaram nesse sistema foram a conquista, a subjugação e o assassínio para roubar. Não se pode renegar as idéias do filósofo a respeito da presente temática, no entanto, também não seria correto homogeneizar um processo tão longo e complexo, como foi o que aqui está sendo tratado. 
            O trabalho foi uma das peças chave de todo esse processo, mais exatamente no que concerne às modificações em sua concepção. Ele chegou a desempenhar um papel primordial para as mudanças ocorridas na espécie humana durante a sua caminhada ao longo dos tempos. Tendo surgido de uma necessidade humana em sustentar-se, ou seja, em garantir a sua sobrevivência, foi se modificando até chegar no que hoje nós conhecemos como trabalho. A mercadoria trabalho acabou por minimizar o papel da figura humana como produtora de conhecimento, sobretudo o tecnológico.  
            Explicando como esse processo chegou aos moldes de hoje em dia, Marx afirma que o dinheiro e a mercadoria teriam que se transformar em capital. Para essa transformação, é essencial que ocorra uma polarização em duas frentes, sendo que ambas possuem mercadorias a serem utilizadas no processo: a primeira delas possui o dinheiro, os meios de produção e os meios de subsistência, enquanto a outra possui a sua força de trabalho. Os primeiros pretendem obter essa força de trabalho, a qual representa o “motor” de toda essa “engrenagem” e os últimos necessitam vender a mesma, pois essa é a única opção para a sua sobrevivência, pois como já foi mencionado no parágrafo anterior, seus meios de conhecimento a respeito da produção foram furtados.
            Analisando esse aspecto, vemos o quanto o capitalismo provocou mudanças na vida cotidiana das pessoas. Se antes trabalhava-se apenas pra sobreviver ou para realizar trocas comerciais, agora o trabalho visa o lucro. Importante frisar que esse lucro não é próprio, mas sim dos capitalistas que se utilizam das forças de trabalho alheias. Unido a esse fator temos a questão que concerne à falta de outras oportunidades desses trabalhadores, infere-se que as suas vidas estavam completamente ligadas e dependentes do seu trabalho.
            Diante dessa relação, tornou-se inevitável a separação entre trabalhador e  meios de produção, e dinheiro e meios de subsistência. Esse processo originou-se de maneira natural e paralelamente ao desenrolar dos fatos que originaram a acumulação do capital e o capitalismo como conseqüência , mas foi, posteriormente, realizado de maneira consciente pelos detentores dos meios de produção. Desse modo, também podemos afirmar que houve, a partir desse processo, uma divisão da sociedade em classes, à medida em que um grupo passou a ser explorado, enquanto outro consolidou-se como dominante. 
            O capitalismo teve as suas origens arraigadas em elementos da economia feudal. Com a desvinculação do servo em relação a sua gleba e, mais tarde, das corporações, este obteve a “libertação” da sua força de trabalho, tendo condições de realizar a sua venda para qualquer pessoa. Por outro lado, esse foi o único meio que o restou, pois os demais meios de produção não mais se encontravam sob o seu domínio. De suma importância frisar que o processo acumulativo de capital teve a sua origem no próprio campo, isso com a mecanização do mesmo e a expulsão dos trabalhadores campesinos para as grandes cidades. Nesses centros urbanos, os grandes industriais, os quais também proporcionaram a expulsão dos trabalhadores do campo, já esperavam essa grande massa em suas nascentes fábricas. Não se pode deixar de frisar a maneira pela qual ocorreu a expropriação do trabalhador de sua terra, que teve um caráter violento e usurpador. Usando o exemplo inglês, durante a Revolução Gloriosa, foram utilizados meios imorais para os capitalistas pudessem se apoderar das terras, inclusive do próprio Estado. Daí se pode extrair uma característica conflitante no que se refere a esse processo observado na Inglaterra: o monarca, Guilherme III, leva consigo ao poder os capitalistas e extratores de mais valia fundiários, e os mesmos tomam do Estado, representado na figura de Guilherme, as suas terras.
            O capitalismo utilizou-se de meios anti éticos e imorais para fazer valer o seu poder e sua força. Em nome do lucro, o homem deixou de ser visto como um ser de sentimentos e racional, passado a ser uma mera mercadoria. E hoje é isso que vemos, aquele que não trabalha está, até certo ponto, à margem da sociedade. Vejamos pois que até a idade na qual se deve trabalhar está prevista, é o que se chama de população economicamente ativa. Esses fatos também são observados quando do processo que começou com a acumulação primitiva do capital e veio a desembocar no capitalismo, fazendo a comparação podemos dizer que o presente está dialogando com o passado.
            Paralelamente ao modo violento utilizado para expropriar as terras, foi utilizada a lei como veículo para realizar o roubo das terras do povo. A classe dominante da época emergiu ao poder e utilizou-se dele para assegurar o seu domínio sobre as terras, utilizando cada vez mais a mecanização no campo. A diferença é que a partir desse momento eles estavam amparados legalmente, mas com as leis que eles próprios fizeram. Na Inglaterra, os cercamentos foram a expressão dessa usurpação legal, se assim podemos dizer. Com eles os grandes proprietários de terra foram apoderando-se das terras dos pequenos proprietários e arrendatários, os quais foram vender a sua força de trabalho nas cidades. Quando observamos esse processo do ponto de vista do camponês, podemos afirmar que os proprietários fundiários tomaram o lugar dos senhores feudais no que se refere a posição de dominantes. No entanto, há uma diferenciação no tocante a esse processo, visto que os senhores feudais exploravam os camponeses, enquanto os proprietários fundiários expulsaram os mesmos de suas terras. A semelhança é que eles continuaram sendo vítimas de um processo brutal.
            A célebre frase de Thomas Morus na sua obra Utopia retrata bem o que ocorreu nesse período: ele fala de um país “onde os carneiros devoram os homens”. O que quis dizer Morus com essa frase? Vejamos pois que ele se referia justamente a essa expulsão dos camponeses para as cidades, isso para realizar a criação de ovelhas, visto que a industria nascente necessitava de lã para realizar o seu abastecimento. Configura-se então uma visão de homem como mera mercadoria em poder dos capitalistas.

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