domingo, 14 de novembro de 2010

Conceito de Moderno e Reformas - Parte 3 (Final)


É importante determinar o ponto no qual a visão a respeito do moderno influi no processo de reforma religiosa. É errôneo afirmar que houve apenas a simples ruptura radical entre o povo e a religião católica. Pois bem, o moderno, expressado pelo pensamento, chegou sim à esfera religiosa, mas, ele não se desvendava apenas através da total ruptura com o catolicismo, mas também através de novos meios de pô-la em prática. Como exemplo, no primeiro caso, há o próprio pensamento luterano, que se desvinculou totalmente do Catolicismo, sendo o ponto de partida para a fundação de novas religiões, já para o segundo, podemos citar as novas correntes surgidas no interior da Igreja Católica.
Como conseqüência dos processos anteriores, houve uma maior secularização da vida social. Durante a Idade Média, a Igreja Católica foi o centro de toda a vida social européia, mas esse quadro veio a modificar-se com a passagem à modernidade. Desse modo, o homem passou a opor-se ao controle clerical no seu dia a dia, desse modo, ele mesmo passou a tornar-se dono de sua existência.
Essa mudança de mentalidade observada no homem, relacionada com os desmandos praticados pela Igreja Católica, encontram-se imbricados na essência reformista. Não foram os excessos em si que, ao serem revelados pelos reformistas, provocaram a revolta, mas sim, a não aceitação desses excessos pelo povo. Ora, se durante todo o período medieval houve luxúria, prostituição e todos os absurdos já citados que ocorriam dentro da Igreja Católica, por que apenas no século XVI houve essa “revolta” das pessoas perante tais fatos? É simples, basta atentarmos para os fatores externos, não tentando explicar a reforma religiosa partindo dela mesma. Tais fatores externos, principalmente os sociais (fome, doenças, pragas), fizeram com que o povo perdesse a sua confiança na Igreja Católica, duvidando da eficácia de se possuir uma fé cega, passando, assim, a interiorizar e individualizar a sua fé.    
A partir desse contexto, a religião passou a se configurar de uma maneira mais interior. Com a tradução da Bíblia, esse processo foi acelerado, visto que as escrituras puderam ser acessadas por mais pessoas, tanto é, que hoje em dia a maioria das famílias ocidentais possui um exemplar da Bíblia cristã em suas casas. Cada uma dessas pessoas que tem acesso ao Livro Sagrado, por mais que sigam os preceitos da sua religião, possuem a oportunidade de ler a Bíblia e formar a sua própria opinião a respeito daquilo que nela está escrito.
Ainda sobre o papel da Bíblia, é correto afirmar que ela teve papel preponderante no processo de expansão do movimento reformista. A partir da sua tradução para diversas línguas pátrias, a interpretação das escrituras tomou diversas conotações, o que acarretou na formação de novas religiões além da Luterana. 
Não se pode excluir desse processo transitório o interior da Igreja Católica, pois a mesma não permaneceu imune a essa modificação nos pensamentos. Essa noção de que nem tudo o que era praticado pela Igreja Romana era correto e que não estava de acordo com as escrituras fez com que nascesse a idéia de que era necessário haver uma reformulação nesse modo de agir, sendo esse o ponto principal que culminaria na Reforma Religiosa. Era o moderno atingindo o seio do Cristianismo. Começam então a surgir movimentos internos na própria Igreja Católica, os quais tinham o intuito de seguir fielmente o que diz a Bíblia, configurando-se como um cristianismo mais puro, sem desvincular-se totalmente dela.   Levando-se em consideração essa análise, cai por terra a noção de que o movimento reformista de Lutero foi o único responsável pela divisão Católica observada no período Moderno. Lutero representou uma ruptura mais forte do que as outras, pois essas primeiras divisões não acabaram por fundar novas igrejas, mas resultaram no aparecimento de ordens diferenciadas dentro da Igreja Católica, a dos Franciscanos foi uma dessas ordens.  
Um ponto importante que inflamou Lutero a rebelar-se diante da igreja Católica foi a sua viagem a Roma, na qual ele pôde observar todos os absurdos praticados pela Igreja Católica, dentre os quais podemos citar: corrupção, a venda de indulgências, relíquias sagradas, a luxúria e a prostituição sendo praticadas pelos membros do alto clero.
A Reforma Luterana não seguiu um caminho linear em todos os locais por onde passou. Esse processo diferenciado ocorreu a partir da maneira pela qual Lutero guiou a sua expansão, realizando-a de maneira setorizada. Lutero formou vários grupos e encarregou-os de levar as suas idéias por todas as regiões da Europa, de modo a facilitar o processo. Por esse motivo, a Reforma Religiosa não pode ser vista como um movimento uniforme, o qual teria ocorrido de maneira semelhante em todos os países no qual foi levado. Relacionamos, então, esse processo, à própria noção de modernidade, a qual, conforme supracitado, não esteve presente com o mesmo formato em todos os lugares da Europa.  
Ao se referir ao tema reforma, não é possível reter-se, apenas, à questão religiosa. O referido termo é muito amplo, principalmente quando a sua utilização ocorre para se referir à Idade Moderna. Por esse motivo, não se pode desvincular a reforma religiosa dos demais processos ocorridos à época, os quais também podem ser tratados como verdadeiras “reformas”. Para exemplificar toda essa complexidade presente no período Moderno, é possível referir-se ao aspecto político. É fato que as idéias luteranas foram bem aceitas pelos soberanos de alguns países europeus, pois proporcionavam uma liberdade não encontrada com a Igreja Católica, principalmente no âmbito político. A luta por uma liberdade religiosa também era um embate ao domínio de Roma sobre os demais reinos europeus. Também é possível relacionar a idéia de reforma a uma modificação na estrutura social européia. A Igreja Católica deixa de ser o centro da sociedade, a qual passa a primar pelo individualismo. Desse modo, sem o rígido controle religioso, tornou-se possível aos países europeus adiantarem-se na questão comercial, sedo importante lembrar que o comércio não desapareceu de todo no período medieval.